A Pornografia da Vingança e a Possibilidade de Indenização por Danos Morais

jun 29, 2022 | Direito de Família

O Revenge Porn ou “pornografia da vingança”, também conhecida por “Pornografia de Revanche”, “Vingança Pornô” ou “Pornografia não consensual”, é uma expressão criada nos Estados Unidos, que diz respeito da divulgação, na internet, de imagens ou vídeos de nudez ou sexo, com o objetivo único de causar danos a ela. Estes conteúdos podem ser obtidos sem o conhecimento da vítima, mas também com o conhecimento dela. Assim dito, na grande maioria das vezes, a produção do material é feita em conjunto e consensualmente com a própria vítima quando das suas relações de intimidade com o agressor.

Em 2010, a prática do delito conhecido atualmente como Revenge Porn tornou- se conhecida oficialmente, nos Estados Unidos, por meio do site IsAnyOneUp.com, que publicava este tipo de material sexual, sem autorização e protegido pelo anonimato, promovendo então uma investigação do FBI sobre o caso, que acreditava que as imagens publicadas eram obtidas por Hackers. No Brasil, essa conduta ganhou significativa notoriedade quando expôs a atriz Carolina Dieckmann. A repercussão do caso fez surgir a Lei nº 12.737 de 2012, que leva seu nome, por apelido.

Além dos aspectos sociais desta prática, que por si só já demonstram seu contexto sexista, ainda é possível especificar-se algumas das consequências emocionais e psicológicas, tais como depressão, suicídio e isolamento da mulher, além da desestabilização em suas vidas sociais, afetivas e profissionais. Neste sentido, estudos aponta que mais de 90% das vítimas sofreram de estresse emocional após o ocorrido; 82% foram prejudicadas de forma relevante em sua vida social ou ocupacional; 49% foram posteriormente assediadas ou perseguidas na internet; 57% temem que a violência sofrida afete sua esfera profissional e, ainda, 54% têm dificuldades em se focar no trabalho ou estudo após o ocorrido e 51% passaram a ter pensamentos suicidas.

A Constituição Federal prevê, em seu artigo 5º, a proteção à intimidade, liberdade e dignidade humana, por meio de diretrizes para a legislação ordinária, e para atualização destas pelo legislador, de acordo com as mudanças sociais. Dessa forma, deve-se destacar que a inércia do Estado em legislar acerca da proteção sobre os direitos fundamentais, de acordo com a incidência de violação sobre estes, contribui para o enfraquecimento do Estado Democrático de Direito, justamente pela ausência de leis específicas e programas sociais que promovam a conscientização da população sobre o uso de tecnologia da informação, e seus riscos.

No que tange a busca por reparos ao dano sofrido, na esfera cível, é possível requerer a reparação por danos morais e materiais, advinda de ilícito civil, relacionado ao direito de imagem principalmente. Salienta-se então que o direito de imagem está previsto na Constituição Federal de 1988, no rol de direitos e garantias fundamentais, sendo este um direito de personalidade autônomo. Neste sentido, é necessário explicitar que, a indenização advinda do ilícito civil pode se enquadrar em dois caráteres, o da reparação material (prejuízos sofridos) e o da reparação moral (geralmente pecuniária, como forma de amenizar o sofrimento enfrentado pela vítima do ilícito).

Nos casos do crime citado, deve-se levar em consideração a hostilidade moral criada em torno das vítimas. Ainda que o agressor seja condenado em valor monetário, a visão da sociedade sobre a conduta dessa mulher jamais será modificada, por mais que esta tenha sido vítima da situação delituosa. Estigmatizada, desmoralizada e vitimizada, o retorno ao status quo anterior parece- nos bastante utópico. Dessa forma, uma possível condenação em danos morais deve se basear no princípio da dignidade da pessoa humana, tema presente no texto da Constituição Federal que deve ser objeto de destaque em todo o ordenamento jurídico, e, inclusive, nas convenções internacionais sobre os direitos das mulheres.

O STJ inclusive já possui entendimento sobre o dano moral presumido nos casos de pornografia de vingança, onde as fotos íntimas da vítima são divulgadas sem o seu consentimento, vejamos:

CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER E DE INDENIZAÇÃO DE DANOS MORAIS. RETIRADA DE CONTEÚDO ILEGAL. EXPOSIÇÃO PORNOGRÁFICA NÃO CONSENTIDA. PORNOGRÁFICA NÃO CONSENTIDA. PORNOGRAFIA DE VINGANÇA. DIREITOS DE PERSONALIDADE. INTIMIDADE. PRIVACIDADE. GRAVE LESÃO.

[…] 4. A “exposição pornográfica não consentida”, da qual a “pornografia de vingança” é uma espécie, constitui uma grave lesão aos direitos de  personalidade  da  pessoa exposta indevidamente, além de configurar uma  grave forma de violência de gênero que deve ser combatido de forma contundente  pelos  meios  jurídicos  disponíveis.  […] a mulher vítima da pornografia de vingança sabe que sua intimidade foi indevidamente desrespeitada e, igualmente, sua exposição não autorizada lhe é humilhante e viola flagrantemente seus direitos de personalidade. (REsp 1004243-07.2017.8.26.0704SP – TERCEIRA TURMA do STJ,
Data do Julgamento: 19 de maio de 2020, Relatora: Ministra Nancy Andrighi).

Ademais, no Brasil, a quase inexistência de legislação a respeito dos cibercrimes, a falta de conhecimento ou informações de grande parte da população brasileira continuam sendo os principais aspectos que motivam a ação criminosa nesse âmbito. Assim, fica evidente que a legislação penal brasileira tem a necessidade do devido amadurecimento no que diz respeito à punição dos crimes praticados em âmbito virtual, em especial àqueles praticados contra as mulheres, o que decorre da inadequação dos tipos penais preexistentes, da rapidez com a qual a tecnologia se desenvolve, da falta de conhecimento técnico dos legisladores e, ainda, da ilimitada e ardilosa criatividade delitiva dos criminosos.

Para sanar maiores  dúvidas e demais esclarecimentos sugerimos a busca  por um suporte jurídico. Nos colocamos a inteira disposição para lhe orientar, será um prazer!

Dayanne  Avelar  Borges Advogada
Especialista em Direito de Família

OAB/DF 67.641